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Em memória de Flávio Andrade, fundador do jornal Em Tempo e do PT

João Antonio de Paula


No início de 1970, o Diretório Acadêmico da Faculdade de Ciências Econômicas da UFMG encontrava-se fechado, desde 1969, como punição contra a ocupação do restaurante da Faculdade por estudantes. Em processo sumário, permitido pelo Decreto Lei no 477, de janeiro de 1969, foram punidos, segundo o jornal Correio da Manhã, os estudantes: Paulo Bicalho dos Santos, presidente do D.A.; Ronaldo Ronan Oleto, vice-presidente; Verben Sério Vieira; 1º secretário; Marcelo Bosch, 2º secretário; Robinson Ayres Pimenta, 1º tesoureiro; Paulo Custódio Pereira, 2º tesoureiro. Em 1999, matéria do jornal Hoje em Dia, publicou lista dos estudantes da FACE punidos pelo DL 477, que incluiu os nomes de: Paulo Bicalho dos Santos, Gildo Macedo Lacerda, Marcelo Bosch, Robinson Ayres Pimenta e Márcio Lacerda, punidos ainda, com a pena de expulsão do país, o estudante Marvin Ortega Rodriguez e ainda, Carlos Tadeu Biondi.


As punições aos dirigentes do D.A. da FACE figuram no amplo processo repressivo que foi recrudescido no país a partir do AI5, de 13 de dezembro de 1968. Naquele mesmo ano de 1969, o Diretório Central dos Estudantes da UFMG, teve toda a sua diretoria presa. Foi neste ambiente tensionado e desafiador, que uma geração de estudantes brasileiros fez sua iniciação política. Foi o caso exemplar de Flávio Andrade, que nos deixou neste 24 de dezembro de 2022, aos 70 anos de idade.


Flávio ingressou na FACE/UFMG, em 1969, calouro viveu aqueles tempos conturbados tendo, desde logo, se colocando à esquerda, combinando estudo sistemático da teoria crítica e intervenção prático-política, que o levou à conhecer, de perto, a realidade das populações pauperizadas de Belo Horizonte. Em 1970, participou da reabertura do DA FACE/UFMG, tendo participado da Diretoria que teve Ivani Alves Costa como presidente. Em 1971, suspendeu seus estudos para acompanhar a esperançosa experiência do governo da Unidade Popular de Salvador Allende no Chile. De volta a Belo Horizonte, em 1972, retomou o curso informado pela experiência chilena em suas reverberações políticas e culturais. Veio com novidades teóricas, como o pensamento de Louis Althusser, ainda pouco conhecido no Brasil, e contato intenso com o pensamento crítico latino-americano representado por Ruy Mauro Marini.


Foram anos de apropriação da teoria crítica, do marxismo, e de atuação política. Flávio destacou-se em todas essas frentes por firmeza e lucidez raras. Polemista implacável desconcertava seus eventuais e incautos contendores pelo uso infalível do método socrático, perguntava, questionava, obrigando o interlocutor a reconhecer o inconsistente de suas posições. Generoso e elegante convencia pela razão e pelo radical compromisso com a revolução social emancipatória.


Graduado em Economia pela FACE/UFMG, em 1973, fez o curso de mestrado em Economia no Cedeplar/FACE/UFMG, tendo sido professor de Economia da Universidade Católica de Minas Gerais, tendo liderado, como chefe do Departamento, importante reestruuração do curso.


Uma vertente importante de sua atuação política deu-se no campo editorial. Como estudante participou de experiências importantes como a revista Polêmica, lançada pelo Centro de Estudos de Economia FACE-UFMG, em 1972. Durante sua participação no DCE/UFMG, foi responsável pelo relançamento da revista Mosaico, também em 1972, tendo participado da equipe que lançou o jornal do DCE/UFMG, Gol a Gol, que revolucionou a imprensa de esquerda entre nós. Em 1975, participou de grupo de apoiadores do jornal Movimento. Em 1977, foi um dos fundadores do jornal Em Tempo. Em 1978, participou da fundação da Editora Aparte, que publicou os Cadernos do Presente, que subsidiaram as lutas dos trabalhadores brasileiros naquele momento de retomada das greves e da reorganização operária.


Morando em São Paulo, desde 1980, Flávio, juntamente com Virginia Maria Guimarães Pinheiro, com quem se casara, com Robinson Ayres Pimenta, Samira Zaidan, Antônio Nahas, João Machado Borges Neto, Juarez Guimarães, entre outros, vão empreender diversas iniciativas no campo editorial como a criação da Gráfica Joruês, a edição do jornal Gazeta de Pinheiros, a edição da revista Leia Livros, a edição da revista EXTRA, que só lançou um número.


Não se perca de vista que a intensa atividade editorial desenvolvida por Flávio fez parte de inafastável compromisso político, em que jornais e revistas eram os veículos de organização, de propaganda, de luta contra a ditadura militar e pelo socialismo.

Afastado da militância política e das atividades editoriais, Flávio dedicou-se aos negócios da família mantendo permanente interesse e solidariedade com a luta socialista. Sua perda, para quem o conheceu, para quem teve o privilégio de sua amizade é um peso a mais que temos que carregar nestes tempos sombrios, que ficam menos enevoados com a lembrança grande de Flávio de Andrade.


Belo Horizonte, 1º/janeiro/2022


Nota do Editor: Fui parceiro em muitas coisas do Flávio Furtado de Andrade, no período intenso de 1977 até 1990, no Em Tempo, na Editora Letra, na Joruês, na Gazeta de Pinheiros, e no PT, desde bem antes da fundação do partido. Guardo com carinho muitos momentos queridos e inesquecíveis vividos com o Flávio. (Sergio Alli)

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